A Morte Materialista – Resenha: A Morte de Rimbaud

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A França tem um acervo vasto no campo da literatura, tendo escritores como Rimbaud, Voltaire e Aragon demonstrando uma técnica que ainda faz muitos leitores baterem palmas para a técnica e originalidade existente nas obras deles; o Konder, um escritor e teórico de esquerda, com toda certeza faz partes dos leitores que demonstra tanto amor à literatura francesa, tanto que ele fez uma homenagem aos escritores no seu livro A Morte de Rimbaud, lançado na editora Companhia das Letras. Será que, no entanto, os homenageados gostaram dessa obra? O Aragon deve ter gostado um pouco, suponho…

O livro conta a história do segurança Sdruws que virou um investigador a mando do seu chefe, o milionário Bergotte – um homem muito extragavante, tento o projeto anges (anjos) como forma de financiar cinco escritores para incentivá-los: Cláudio Nicodemo da Silva, o Claudel (convêm do nome Claúdio); Mauro Teodoro dos Santos Oliveira, o Malraux (convêm do nome Mauro); José Tibúrcio Golçalves Aragão, o Aragon (convêm do nome Aragão); João Carlos Suslov, o Rousseau (convêm do apelido dele, “Russo”); e Severino Cavalcante, o Rimbaud (também convêm do apelido dele, “Rambo” -, para investigar a morte do Rimbaud, que sofreu uma fratura no crânio quando caiu do seu bangalô – todos os escritores tem o seu próprio bangalô e todos eles se localiza em Guariroba. Com a ajuda de alguns personagens, como o Saint-Ex, um funcionário do mecenas Bergotte, da Rosinha, a lavandeira, e da dra. Drica, uma fisioterapeuta, ele investiga a vida dos anjos para tentar descobrir informações que sejam relevantes ao milionário e revelar quem foi o assassino.

Quando vi o livro pela primeira vez, matutei: “hm, ele aparenta ser interessante. Vou comprá-lo depois.” Depois de alguns dias pensando sobre como seria a história, eu o comprei supondo que seria algo parecido ao Hyde, do Daniel Levine – uma reconstrução do clássico O Médico e o Monstro (muito agradável, aliás). Quando fui ler a sinopse (o livro estava colado em um outro, que não lembro qual era, o que me impedia de olhar a sinopse antes de comprá-lo), que consiste:

“Um milionário apaixonado por literatura francesa resolve sustentar cinco escritores que julga muito talentosos. Passa a chamá-los pelo nome de grandes autores franceses: Rimbaud, Aragon, Rousseau, Malraux e Claudel. Oferece-lhes uma polpuda verba mensal e despacha-os anualmente para férias na França. Rimbaud é encontrado morto. Pode ter sido acidente – ou não.”

No início, fiquei um pouco desapontado, já que eu estava esperando que fosse utilizado, de fato, os escritores como personagem, mas reconsiderei: “Bem, pode não ser os próprios escritores, e a sinopse é bem seca, mas talvez a estrutura e a técnica seja bem fundamentadas…” De fato, a estrutura é diferente: cada capítulo (dia) continha a narração nos olhos de vários outros personagens, contando o que ocorreu nesse dia; e a psicologia dos personagens, ou seja, o que eles pensam, quais são os seus sentimentos, é ignorado para dar ênfase nos atos que fazem, como forma de deixar a leitura mais rápida e dinâmica – além de dar toque materialista. É positivo? Temo dizer que não.

A ideia de usar os personagens como narradores é uma boa ideia e já li dois livros que faz a mesma coisa (O Peso do Silêncio, da Gudenkauf, e Todos Contra D@nte, do Luís Dill. São livros medianos, com os seus pontos fortes e pontos fracos), só que nesse livro não é utilizado de forma muito proveitosa: na grande parte dos acontecimentos, o Sdruws está participando no que está sendo narrado diretamente, fazendo o questionar o motivo de ter quase todos os personagens como narradores se eles poderiam ter sido substituídos facilmente por um único narrador – que, ao meu ver, deveria ser o Sdruws. Suponho que, para tentar driblar a falta de aprofundamento em muitos personagens, como o Rousseau, o autor tenta dar a fala para os personagens mais relevantes como forma de dar mais vida para eles; tem um certo efeito desejado, sim, mas ainda assim não deixa de ser decepcionante, pois as falas dos personagens não tem uma característica única, ou seja, muitas falas dos narradores são fracas demais no quesito de personalidade, não existe uma originalidade, deixando existir unicamente a visão do que ocorre com alguns detalhes a mais.

Falando dos personagens, tenho que dizer que o enredo do livro é definitivamente um dos mais fracos que eu já li. Ignorando o fato dos Anjos não se assemelharem com os escritores franceses em questão de personalidade – infelizmente Konder não demonstrou algum trecho de alguma obra desses Anjos, o que teria ajudado na construção da imagem deles -, eles não demonstram ter um espírito de alguma pessoa, em outras palavras, raramente demonstram atos concisos e/ou sentimentais, pois eles, ao meu ver, não estão na história para serem agentes que sofrem com o exterior (natureza, pessoas), mas sim para representar materialisticamente o mundo – para deixar um pouco mais claro, o autor implica que os Anjos foram corrompidos pelo Bergotti por causa do financiamento que ele dava para eles, e não pelos próprios atos e falta de virtude dos escritores; no fim, a culpa de todos os erros cometidos por eles não são deles, mas sim do milionário.

Sdruws, tirando algumas cenas dele que soa um pouco inverossímil, é um bom protagonista: é astuto, forte e age como uma pessoa qualquer (quando ele está enfrentando coisas reais, como uma briga, e não por conveniência política do autor, como no final); a Drica é um pouco excêntrica, mas é uma personagem bem OK, mas o romance entre ela e Sdruws que se desenvolve na história é fraco, já que não há enfaze nos sentimentos e sensações dos personagens nas narrações; já a Rosinha e o Delegado são personagens bem genéricos, mas mal formulados: enquanto a lavandeira tem uma imagem forçada, mas não no ponto de se mostrar irreal, de uma promiscua, mas que tem relevância nos acontecimentos na história, o Delegado é apenas… Um delegado. Nada mais.

Não posso dizer se Konder é um escritor bom ou ruim, mas esse livro, ainda que leve para ler, dificilmente agradará os leitores por causa dos problemas que listei – a não ser que os leitores sejam marxistas que aceita tudo que vem dos simpatizantes dele. Dou meu agradecimento ao escritor por tentar escrever de uma forma diferente, tentando valorizar a fala dos personagens, só que a forma que foi exercida a ideia acabou matando o livro, enquanto a forma superficial que trata a relação das pessoas com o dinheiro serviu para enterrá-lo numa cova bem pequena e ignóbil.

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